A AMATRA XV recebeu o trabalho “FATORES PSICOSSOCIAIS, ADOECIMENTO E PRESENTEÍSMO EM MAGISTRADOS DO TRT DA 15.ª REGIÃO”, desenvolvido pela Juíza Patrícia Maeda, Ex-Presidente da AMATRA XV (2.018/2.019), pelo Professor Sérgio Roberto de Lucca, do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, e pelo Fisioterapeuta Fauzi El Kadri Filho, da Secretaria de Saúde do TRT/15.ª Região.
Trata-se de pesquisa que buscou “aprofundar o conhecimento sobre a natureza do trabalho dos magistrados do Tribunal Regional do Trabalho da 15.ª Região e avaliar os fatores psicossociais associados à ocorrência de sintomas osteomusculares e presenteísmo nesta população”. Com 49 páginas, o texto completo pode ser acessado clicando aqui.
Metodologia
O estudo sobre fatores psicossociais do trabalho – FPTs foi desenvolvido utilizando o instrumento de avaliação “Health & Safety Executive – Indicator Tool (HSE-IT)”, “que contempla sete dimensões do ambiente laboral que estão associados com reduzidos níveis de saúde, produtividade e bem-estar e elevados níveis de absenteísmo. As dimensões do HSE-IT incluem as demandas de trabalho, controle e autonomia, suporte dos colegas de trabalho e das lideranças, os relacionamentos, a importância e relevância do cargo e o nível de comunicação e de mudanças na organização.”
Também, o “Stanford Presenteeism Scale – SPS-6”, que avalia o presenteísmo, “composto por seis itens, em uma escala tipo Likert, variando de um (discordo totalmente) a cinco (concordo totalmente)”.
As técnicas e métodos da pesquisa foram previamente apresentados e debatidos com a AMATRA XV, obtendo-se autorização da Direção do TRT/15.ª Região e aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UNICAMP – CEP (Parecer 2.989.149/2.018). A condução dos trabalhos observou a Resolução CNS n.º 466/2.012 e regras afins.
Ainda, foram considerados textos normativos como a Lei n.º 13.467/2.017, na parte que versa sobre teletrabalho, as Resoluções CSJT n.ºs 151/2.015 e 174/2.016, bem como a NR 17, além de vasta bibliografia.
Em uma primeira etapa, 151 Magistrados responderam todos os itens dos instrumentos de coleta de dados, disponibilizados (online, por intermédio da ferramenta “SurveyMonkey®”) no período entre novembro/2.018 e janeiro/2.019. Na segunda fase, 12 deles participaram de “entrevistas em profundidade”, com duração de 1h a 40min. cada.
Segundo os Autores:
“A nossa hipótese é de que, à medida que as TICs [tecnologias de informação e comunicação], por meio dos sistemas informatizados aumentaram o número de processos e diminuíram os prazos para sua conclusão, a intensificação do trabalho tem potencial para o adoecimento, ainda que esta condição não tenha conduzido ao afastamento do trabalho.”
Perfil dos participantes
a) Fase da carreira:
a.1) Juízes do Trabalho Substitutos: 50,3%;
a.2) Juízes Titulares de Vara do Trabalho: 41,7%;
a.3) Desembargadores do Trabalho: 7,9%(*)
(*) Totalizando 99,9%; a diferença decorre de arredondamentos.
b) Sexo:
b.1) Feminino: 49,7%
b.2) Masculino: 50,3%.
c) Situação de saúde:
c.1) Doenças causadoras de dor osteomuscular: 23,8%;
c.2) Afastamento do trabalho nos últimos 12 meses: 22,5% (tempo médio de afastamento de 7,9 dias);
c.3) Uso de medicamentos controlados (psicofármacos e outros): 33,1% (1,33% não responderam).
c) Outros dados:
- 78,8% casados; a maioria (82,1%) possui filhos;
- quantidade média de trabalho: 50,3 horas semanais;
- tempo médio na carreira: 14,3 anos.
Os Pesquisadores ressaltaram que “não houve diferença estatisticamente significativa entre a carga horária semanal de acordo com o cargo ocupado.”
Estudo personalizado, que analisa de forma específica as condições laborais dos Magistrados do Trabalho
Merece destaque o fato de que a pesquisa considera as idiossincrasias da Judicatura. Nas palavras dos autores da pesquisa:
“Considerando-se que os magistrados que compõem os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) constituem uma categoria profissional singular, uma vez que o trabalho do juiz é caracterizado por normatizações, regimentos e códigos de condutas que incluem comportamento no trabalho e na vida social, cujas decisões nos processos trazem consequências diretas para os atores envolvidos, incluindo a percepção dos juízes que podem se sentir ameaçados ou sofrerem ameaças, esta pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de avaliar as condições de trabalho destes profissionais e suas relações com o adoecimento e o presenteísmo.”
Eles sopesaram situações como:
- pressões e constrangimentos decorrentes da condição de Agente Público, dos interesses conflitantes das pessoas em litígio e das “críticas e companhas negativas veiculadas pela mídia, especialmente nos últimos anos”;
- as dificuldades inerentes à atividade jurisdicional: analisar teses, apreender o que foi escrito e prolatar sentença, o que passa tanto pela análise técnica quanto por “questões subjetivas não escritas no processo ou verbalizadas diretamente”;
- a responsabilidade profissional.
Doenças causadoras de dor osteomuscular
O texto menciona que as “queixas em pescoço, ombros e coluna (partes superior e inferior das costas) foram apontadas com maior frequência pelos magistrados (quase 70% dos participantes) e contribuíram para os impedimentos no exercício das atividades de vida diária e o comparecimento a consultas com profissionais de saúde”.
Explicam que:
“Diferentemente dos resultados de pesquisa anterior realizada com os servidores da área judiciária do TRT 15, que apresentaram maior proporção de queixas em punhos e mãos, a qual está mais bem relacionada com o uso intensivo do computador, as dores ou desconfortos em coluna e ombros referidas pelos magistrados devem estar relacionadas com tempo prolongado de permanência na posição sentada e à concentração cognitiva e tensão elevada, independentemente do uso do computador.”
Dentre as sete dimensões examinadas em relação aos FPT´s, “verificou-se que as ‘demandas’ ou exigências do trabalho, ‘Sobrecarga, altos níveis de pressão por tempo, continuamente sujeito a prazos’, contribuem para o risco de desencadeamento de estresse entre os magistrados, uma vez que o valor médio para esta dimensão foi de 2,3. Para os magistrados, as elevadas exigências e demandas de trabalho se configuram como a principal dimensão de estresse e potencial adoecimento.”
Na explicação dos Autores,
“Quanto mais próximo do valor 5 (cinco), pode ser considerado um fator protetor, enquanto que valores abaixo de 3 (três) são preditores de risco de adoecimento.”
Presenteísmo
É o “fenômeno caracterizado pelo comparecimento no trabalho ou nas atividades de trabalho, ainda que adoecido”.
Uma expressiva quantidade de Magistrados, 70,9%, relatou problemas de saúde nos últimos 30 dias (da pesquisa), a despeito dos quais comparecem às Unidades Judiciárias e realizaram seus serviços regularmente. Em 31,1% dos casos o presenteísmo resultou em “menor capacidade de concentração e desempenho nas atividades de trabalho”.
Os Pesquisadores trazem conclusão relevantíssima:
“Estes resultados apontam para o fato de que a condição de adoecimento no trabalho dos magistrados pode estar prejudicando a qualidade do trabalho realizado, ainda que o quantitativo de processos analisados não tenha sofrido redução significativa.”
Entrevistas com os Magistrados (análises “qualitativas”)
Invariavelmente, os entrevistaram enfatizaram a importância da Magistratura para a sociedade. Destacaram o esforço em compreender a singularidade dos processos e a subjetividade das partes, bem como em conduzir os litigantes à conciliação. Neste sentido, referiram ao impacto positivo das ações de Órgãos como o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Disputas – NUPEMEC-JT e dos Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas – CEJUSC´s-JT.
Nos dizeres dos Pesquisadores,
“O significado do trabalho para os magistrados não se resume a um resultado quantitativo de conciliações à medida que subjetivamente pode reconstruir relações afetivas entre as partes envolvidas no conflito.”
Também existe convergência quanto aos benefícios do sistema de informatização no judiciário. Mas há menção a aspectos negativos:
- saúde física: dores de cabeça, nos ombros e na coluna;
- higidez emocional: a forma como os instrumento de controle são usados, causando constrangimento, pois as cobranças só observam parâmetros quantitativos.
Segundo os Pesquisadores, exige atenção, no que concerne à “saúde mental” e “sofrimento psíquico” dos entrevistados, “o aumento da produtividade e do isolamento do trabalho”. Também, “a intensificação dos mecanismos de controle e de cobrança individual”.
“A maioria dos juízes entrevistados se ressente da impessoalidade das cobranças da corregedoria e da falta de reconhecimento e feedback positivo sobre o trabalho”, comentam os Autores.
Proposições
Dada a singularidade de cada relação processual, os entrevistados sustentam que os dados qualitativos devem prevalecer sobre o exame estritamente quantitativo do trabalho. “Alguns apontaram”, como fatores negativos, “‘a adoção do critério impessoal das cobranças sem considerar ou avaliar o histórico do juiz e as respectivas singularidades’.”
Além disso, reputam importante considerar particularidades locais, como as regiões em que a conciliação é mais difícil ou menos comum.
Também propugnam por mais manifestações positivas quando o trabalho é bem desenvolvido:
“Por outro lado, alguns Juízes do Trabalho que avaliaram seus desempenhos individuais como acima da média, pontuaram que não auferem qualquer gratificação adicional, e tampouco recebem um reconhecimento simbólico, na forma de agradecimento ou feedback positivo por parte da Instituição”, pontuam os Pesquisadores.
Em termos de sugestões, o estudo contém, resumidamente, o seguinte:
a) atuação “humanizada” da Corregedoria:
a.1) ouvindo mais os juízes de 1.ª Instância;
a.2) conversando individualmente com o Magistrado que esteja fora (abaixo) da média;
a.3) realizando ações prioritariamente educativas, em lugar do viés corretivo;
b) análise do histórico do Juiz;
c) introdução de parâmetros qualitativos, como o grau de dificuldade dos processos e a efetividade da resolução judicial.
Importância da AMATRA XV e outras conclusões
Os entrevistados reconhecem a importância da Associação e as dificuldades na conciliação dos interesses das três fases da carreira. Consta no trabalho:
“‘A AMATRA deve enfatizar os fatores psicossociais de risco que contribuem para o adoecimento dos juízes’. ‘No dia a dia predominam excesso de demanda e falta de comunicação e questões de assédio no processo de gestão e nos relacionamentos pessoais’”.
Destacam, ademais, a importância da Escola da Magistratura (EJUD 15), salientando que não pode ser ideologizada, conjugando a diversidade de opiniões.
O trabalho é finalizado com as proposições abaixo, sintetizadas:
a) há que se considerar a natureza e a complexidade dos processos ao se estabelecerem metas e na cobrança de produtividade;
b) a cobrança por produtividade não deve se centrar em critérios quantitavivos;
c) o adoecimento profissional dos Magistrados pode estar prejudicando a qualidade do seu trabalho, ainda que não haja deficit quantitativo de produtividade;
d) ante “a relação existente entre o presenteísmo e o absenteísmo, é fundamental que os magistrados que trabalham nestas condições de adoecimento sejam acompanhados, pois o parâmetro ‘produtividade’ pode estar encobrindo uma situação de presenteísmo prévia a um afastamento do trabalho”.
A AMATRA XV acredita que os resultados desse trabalho podem embasar futuras gestões junto ao Tribunal, visando a melhoria das condições de trabalho e a preservação da saúde dos Magistrados.