20ª Vara Cível SP
MANDADO DE SEGURANÇA
Processo nº 2006.61.00.025726-9
Impetrante: ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MAGISTRADOS - APAMAGIS e ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO - AMATRA XV
Impetrados: PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIREITOS E PRERROGATIVAS DA OAB/SP e PRESIDENTE DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO SÃO PAULO
Vistos, em Decisão Interlocutória.
Ajuizaram as impetrantes este mandamus, com pedido de medida liminar, pleiteando, em síntese, determinação para a imediata suspensão, pelos impetrados, da veiculação, por qualquer tipo de mídia ou pela internet, dos nomes dos associados das impetrantes que constem do chamado "Cadastro das Autoridades que receberam Moção de Repúdio ou Desagravo", da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção São Paulo.
Aduzem as impetrantes, preliminarmente, que atuam como substitutas de seus associados, possuindo legitimação extraordinária para representá-los em Juízo. Quanto ao mérito, relatam que a Seccional Paulista da OAB elaborou o aludido cadastro, ou lista dos "inimigos da advocacia", contendo nomes de autoridades e outras personalidades que foram alvos de moções de repúdio e de desagravos de advogados, envolvendo juízes, promotores de justiça, procuradores da república, funcionários públicos, delegados, policiais e jornalistas, tornando pública a lista através da internet, que tal cadastro, além de expor o nome das pessoas que dele constam como personae non gratae, assim julgadas segundo critérios subjetivos da própria OAB, penaliza-as com a impossibilidade de, no futuro, exercerem a advocacia.
Alegam as impetrantes, em resumo, que a inscrição no mencionado cadastro resulta de um processo interno na Autarquia, sob argumento de dar efetividade ao direito do advogado de promover o desagravo público, conforme previsto no art. 7º inc XVII e § 5º da Lei nº 8.906/94; que, no entanto, não há qualquer previsão legal ou regimental para que os desagravos concedidos componham listagens de domínio público; que os Juízes têm a prerrogativa de julgamento pela Corregedoria e pelo Conselho Nacional de Justiça; em suma, que tal cadastro funciona como meio de exposição e discriminação.
Passo a decidir.
O deferimento de medida liminar, em Mandado de Segurança, pressupõe a ocorrência das condições cumulativamente previstas no art. 7º, II, da Lei nº 1.533/51, vale dizer, a plausibilidade do direito alegado e o periculum in mora, se tardio o provimento jurisdicional.
In casu, considero presentes ambas as condições.
De um lado, a lista disponível na internet, para quem queira consultá-la, e que começou a ser noticiada, na mídia, no início de novembro, fere diversos direitos e garantias fundamentais, elencados nos diversos incisos do art. 5º da Constituição da República de 1988.
Dentre eles, releva o princípio cardeal da legalidade, consagrado no inciso II, eis que as autoridades impetradas não possuem competência, legalmente outorgada, para o julgamento de magistrados, nem a fortiori, para imposição de penalidades.
Relacionados ao princípio da legalidade, surgem, igualmente, agredidos os direitos ao juiz natural, ao devido processo legal e ao contraditório e à ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, consagrados nos incisos LIII, LIV e LV, respectivamente, do mesmo art. 5º.
Além do mais, a atitude dos impetrados viola, simultaneamente, os direitos à honra e à imagem, e ao livre exercício de trabalho ou profissão, nos termos dos incisos X e XIII, respectivamente, do art. 5º da Lei Maior.
Como é cediço, todos esses direitos integram o chamado cerne fixo, ou cláusula pétrea da Constituição de 1988, nos exatos termos do seu art. 60, § 4º, IV, circunstância que confere especial dignidade ao rol de direitos e garantias, declinados no referido art. 5º.
Não esqueçamos que, nos termos do art. 44 da Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, que veicula o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, entre as finalidades da Ordem avultam a defesa da Constituição, da Ordem Jurídica do Estado democrático de direito, entre outros, verbis:
"Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e de forma federativa, tem por finalidade:
I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;
II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil." (grifei)
Assim, é de se lamentar que a respeitabilíssima instituição - que se notabilizou na defesa dos direitos humanos, com a manutenção da chama da esperança, nos tenebrosos e longos anos da ditadura - adote o inacreditável comportamento, ora questionado, ao arrepio da lei e da constituição.
Quanto ao disposto no citado inciso II do art. 44 fica evidente a competência da OAB para a representação, a defesa e a disciplina dos advogados, e, não de qualquer outra categoria profissional, devendo, nesta hipótese, valer-se dos canais e órgãos competentes, na forma da lei.
Patente, pois, neste passo, a plausibilidade do pleito das impetrantes.
Também julgo presente o periculum in mora, em face dos evidentes e imediatos prejuízos que a divulgação do cadastro em tela causa aos filiados das impetrantes.
Ante o exposto e o que mais dos autos consta, DEFIRO A MEDIDA LIMINAR pleiteada, determinando aos d. Impetrados que suspendam, imediatamente, a veiculação dos nomes dos associados das impetrantes (conforme rol de fls. 17/18), por qualquer meio de comunicação, em especial, pela internet, que constem no "Cadastro das Autoridades que receberam Moção de Repúdio ou Desagravo".
Notifiquem-se as autoridades impetradas, para ciência e cumprimento, bem como para que prestem suas informações, no prazo legal.
Após, dê-se vista ao Ministério Público Federal.
Por fim, venham os autos conclusos para sentença.
P.R.I. e O.
São Paulo, 07 de dezembro de 2006.
RITINHA A. M C. STEVENSON
Juíza Federal